Hoje, dia 15 de outubro, dia dos professores, o Canal da In traz um incrível exemplo de transformação pela educação. A Escola Municipal Aida Andrade Chaves, localizada no bairro Satélite Andradina, em Ituiutaba (MG), é o cenário de um trabalho pedagógico que une educação, sustentabilidade e empreendedorismo infantil. Desde 2022, as professoras Cárita Bárbara de Almeida e Vanelle de Freitas Santos desenvolvem projetos com alunos do 4º e 5º ano do Ensino Fundamental, incentivando o aprendizado por meio da prática e da autonomia.
Cárita, que leciona na rede municipal desde 2014, contou que sua trajetória na escola começou com o desejo de atuar perto de casa. “Eu moro aqui no bairro Satélite Andradina, e eu dava aula em outras escolas. Eu queria trabalhar aqui, mas pra isso precisava ter pedagogia. Então eu fui fazer pedagogia pra trabalhar perto da minha casa.” Desde então, ela se dedica à educação integral, com turmas de cerca de 18 alunos, desenvolvendo atividades integradas às disciplinas tradicionais.
Vanelle, que está na rede municipal desde 2021, assumiu este ano a turma do 5º ano na escola, onde trabalha com alunos de 10 a 11 anos. “São crianças maiores, então é mais fácil de manusear os materiais”, contou. As turmas dela costumam contar com cerca de 22 alunos.
Ambas as professoras desenvolvem projetos distintos, mas que conversam entre si, e têm a mesma finalidade: levar aos alunos noções de empreendedorismo, independência financeira e proporcionar experiências que elas não vivenciam com frequência em seus cotidianos.
De uma horta condenada a um projeto transformador
O projeto de empreendedorismo da escola surgiu de um contratempo. Cárita relembrou que, em 2022, uma parceria com a UEMG e o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) buscava integrar atividades de compostagem e horta escolar. “A nossa horta foi condenada porque o gatinho entrou lá e fez cocô. E aí o que a gente ia fazer com aquela compostagem? Um aluno disse: ‘Tia, vamos vender! A minha avó compra essas coisas na lojinha lá do centro’ ”.
A sugestão do aluno deu origem ao primeiro produto da turma: pacotes de adubo orgânico vendidos na comunidade. Com o lucro, os alunos foram tomar sorvete no centro da cidade. Uma experiência simples, mas marcante. “Pra gente que é adulto, isso é muito comum. Mas pra uma criança, não é. O fato dela estar andando no centro, escolhendo o sabor, já é uma experiência nova. Ela começa a sonhar”, contou Cárita.
A partir desse episódio, a professora passou a desenvolver o tema do empreendedorismo social com os alunos. “A BNCC traz trabalhar as habilidades do empreendedor dentro da sala de aula. O produto e a venda são só a pontinha do iceberg. O mais importante é o processo, o crescimento deles, a forma como passam a pensar”, relatou.

Produção sustentável e aprendizado coletivo

Os projetos da Aida Andrade Chaves envolvem diferentes etapas, desde a pesquisa científica e experimentação até a produção e comercialização. Cárita contou que o processo é colaborativo e cheio de descobertas. “Uma vez a gente estava estudando sobre a aloe vera e os benefícios das plantas medicinais. Aí o aluno falou: ‘Nossa, a gente podia fazer um sabonete’. E a gente fez, errou várias vezes, mas eles viram o quanto o erro é importante pra crescer.”
O sabonete de aloe vera se tornou o produto mais simbólico da turma, enquanto o sabão líquido feito com óleo usado é o mais rentável. “O sabão veio de uma iniciativa deles também, quando discutimos formas de proteger o meio ambiente. A gente faz o sabão líquido e vende. O mais bonito é o sabonete, o mais rentável é o sabão de óleo usado.” As atividades exigem atenção redobrada da professora. “As crianças não conseguem fazer sozinhas, porque pra fazer o sabonete eu mexo com fogo e faca, e pra fazer o sabão a gente mexe com soda. Então tem que estar ali supervisionando. Por mais que eu ajude, não consigo uma produção grande,” explicou.
As professoras afirmam que o trabalho é limitado mais por mão de obra do que por tecnologia, e por isso sonham em ampliar o envolvimento da comunidade. “O ano passado até ocorreu isso, mas sem ser forma de cooperativa. Várias mães começaram a fazer sabão líquido pra vender também, porque as meninas aprenderam na escola, ensinaram pra mãe, e elas começaram a vender,” relatou Cárita.
A professora Vanelle de Freitas, por sua vez, trabalha com hortas hidropônicas e vassouras ecológicas feitas de garrafas PET.
O sistema de cultivo em água e nutrientes se tornou um sucesso entre os alunos e professores. “Aqui na escola já vende tudo, não dá nem tempo de sair. As meninas saem vendendo de manhã pras professoras, eu venho colher e elas fazem a entrega,” contou.
O projeto rendeu cerca de 123 mudas de alface, colhidas e vendidas em ciclos de cerca de trinta dias. A limitação, segundo a professora, é o espaço físico: “Se tivesse mais espaço e mais canos, tudo que colocasse ali, venderia. Em três dias, acaba tudo.”
O projeto de hidroponia, além de ensinar noções de hidrocultura, reforça a relação dos alunos com a terra e o cultivo. “Tem muitos alunos do quinto ano que têm avós ou pais que plantam em casa. Eles chegam e querem comparar o que fazem lá com o que aprendem aqui, porque é diferente — não vai terra, é só a água e os nutrientes,” contou Vanelle.
Os produtos feitos pelos alunos em sala de aula tem um valor especial, porque são consumidos por eles e suas famílias. O sabonete, o sabão líquido, a alface e as vassouras são produtos do cotidiano, o que torna a experiência válida não só pelo aprendizado que ele proporciona, mas também por sua usabilidade.

Aprendizado para além da sala de aula
Os materiais utilizados nos projetos são inicialmente comprados pelas próprias professoras, que se reembolsam com as vendas. “Eu pego o meu dinheiro e compro. Depois, conforme vai vendendo, eu me pago.”, disse Cárita; Vanelle complementou: “O meu é assim também.”
Os produtos são comercializados na escola e na comunidade local, especialmente durante eventos. “Sempre que tem alguma oportunidade, a gente sai da escola. O ano passado, por exemplo, teve um torneio de pipa. A gente levou os alunos pra participar e pra vender sabonete”, explicaram as professoras.
Elas contam que os alunos gostam tanto de produzir quanto de sair para vender os produtos. “Todos os dias eles ficam “hoje a gente vai vender? Hoje a gente vai vender?”. Porque eles amam sair pra vender. No sol quente, ou chovendo, eles querem sair pra vender”, contou Cárita.
Projetos já receberam prêmios na região

Os projetos ultrapassaram os muros da escola e chegaram à Feira de Iniciação Científica do Pontal (FICP), um dos eventos educacionais mais tradicionais do Triângulo Mineiro.
A feira é promovida pelo professor Pedro Gilberto, da Escola Estadual Tônico Franco, e conta com a participação de escolas públicas e particulares, além de parcerias com a Prefeitura de Ituiutaba e a Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). “Ela ocorre em agosto de todos os anos. É feita na faculdade. A gente leva os produtos para apresentar e também para vender,” explicou Cárita.
Na edição de 2023, a professora apresentou um projeto com papéis reciclados, que conquistou o primeiro lugar na feira. Em 2024, foram dois projetos distintos: o sabonete artesanal de aloe vera, que ficou em primeiro lugar, e a compostagem orgânica, que conquistou o segundo lugar, ambos na categoria Ensino Fundamental I.
O reconhecimento em 2023 garantiu a classificação da equipe para a Mostratec, feira nacional realizada no Rio Grande do Sul, mas a viagem não pôde ser realizada. “Só que a gente não foi por falta de verba,” relatou Cárita.
Aprendizado que transforma realidades
Mais do que ensinar a produzir e vender, os projetos têm transformado a forma como os alunos enxergam o mundo. “Quando você trabalha empreendedorismo com os alunos, você não está só trabalhando um produto e venda. Você está trabalhando pensamento crítico, resolução de problemas, criatividade. Eles aprendem a não desistir, a pensar antes, a procurar soluções,” explicou Cárita.
Os próprios alunos relatam o quanto os projetos são importantes para eles. “É muito ‘mais bom’ pra as escolas oferecer, ensinar. No caso, antigamente não era desse jeito, não tinha nada”, relatou um aluno. Os alunos que fazem parte dos projetos compartilharam, durante a entrevista, que ficam felizes quando o que eles produzem é consumido por eles mesmos e por suas famílias. “Nós aprendemos várias coisas e é muito bom pra nós fazer, porque nós aprendemos”, apontou outra aluna.
E os resultados emocionam. Cárita lembra os primeiros passeios promovidos com o dinheiro arrecadado: “Tem aluno que fala: ‘Tia, é a primeira vez que eu tô realizando meu sonho, é o melhor dia da minha vida’. Alguns nunca tinham ido ao cinema ou tomado sorvete fora de casa. Eles se sentem importantes”.

Hoje, os alunos colecionam experiências proporcionadas pelo projeto. Visitas a clubes aquáticos, idas ao cinema, sorveteria, pizzaria, brinquedotecas/fliperamas, e até viagens para outras cidades. O destino planejado para este ano é Peirópolis, distrito de Uberaba (MG), conhecido por seu museu de fósseis, um passeio educativo que vai unir conhecimento e diversão. “Eles colocaram a meta lá, de quanto de dinheiro eles precisam pra conseguir ir”, explicou Cárita.
As experiências extrapolam o ambiente escolar. “A gente recebe feedback dos pais, que percebem a mudança em casa. Os alunos ficam mais confiantes e determinados,” completou. Dona Cleonice, aluna do EJA e tia-avó de uma das alunas, concordou, e disse que ganhou um momento com a sobrinha-neta através dos projetos: “Ela fica explicando o que que é, como a gente faz… Que é pra nós fazermos lá em casa, né? Nós duas”.
Para as professoras, o impacto maior está em fazer os alunos acreditarem que podem transformar o próprio ambiente. “Eles podem mudar a realidade deles. Basta querer, ter uma meta, ter estratégia. É possível transformar o lugar onde estão.”
											
								
								
															

